Eduardo Fanecas (Geração 2098)
O trunfo da Máfia Brás não era a agressividade, a perspicácia ou o portento bélico. Os Brás subsistiam pela discrição. Longe de ter o poderio da Máfia Rato, os Brás eram apelidados de máfia camaleão, ou máfia transparente. Eram fortes nas acções de tráfico, que requeriam uma boa dose de camuflagem. Insatisfeitos por não possuir esse domínio no tráfico, os Rato nutriam pelos Brás um ódio profundo. Eduardo Fanecas não tinha um especial apreço pelos Rato, mesmo depois de lhes vender a sua casa de alterne. Mesmo assim, sentia que lhes ia fazer um favor…
Eduardo conhecia há anos o quartel-general dos Brás. Ricardo Brás, patrão da Máfia Brás, havia sido um grande parceiro de crime do seu pai, Selénio Fanecas. Muitas tardes tinha ali passado enquanto criança… A cooperação Brás-Fanecas aguentara-se longos e frutíferos anos, até que o ódio se plantou entre ambos, quando Ricardo Brás denunciou Selénio à justiça, em troca da prisão domiciliária. Desde a traição, Selénio alimentou um ódio crescente pelo infértil mafioso. Eduardo conhecia a traição e conhecia o ódio. Agora, faltava conhecer o prazer. O prazer de matar. Era essa busca que ali o trouxera, e Ricardo Brás era o alvo perfeito.
Os eucaliptos abundantes davam um cheiro fresco àquele recanto escondido na floresta densa. Embora quase imperceptível, aquele esconderijo não tinha para ele segredos. Passou a vedação sem dificuldade, e os cães não lhe fizeram caso. Com uma mão no punhal e a outra no revólver, não receou encontrar guardas. Nem que receasse, não os encontraria. Os Brás eram demasiados confiantes na sua arte do esconderijo para desperdiçar recursos com guardas. No entanto, o descuido da pequena família mafiosa chegava aos extremos, pois nem uma porta trancada deu resistência a Eduardo! Uma vez dentro de casa, deu passos curtos e leves. Sabia o quanto rangia aquela madeira… Deu um passo, e outro, e outro, e quando deu por ela estava à porta do escritório de Ricardo. Tudo naquela casa continuava como se lembrava. A porta estava entreaberta, mas não ouvia ruído vindo do escritório. Se bem se recordava, Ricardo passava ali dias inteiros! Onde mais poderia estar, se não ali?… Não quis espreitar, para não se revelar. Embora não ouvisse barulho, sentiu que Ricardo estava do outro lado daquela mesma porta. Eduardo sabia que a secretária de Ricardo dava de caras com a porta que teria que passar. A sua entrada teria que ser rápida e incisiva. Como planeado, tudo ocorreu num ápice: Eduardo pontapeou a porta e imediatamente viu Ricardo, que o olhou, assustado, nos olhos. Mal teve tempo de exclamar «Eduardo!?…», e já tinha a primeira bala alojada na mão direita. Pouco depois, na esquerda também. Pensavas que ias ter uma morte rápida?… Bem te enganas, cabrão de merda. Correu para ele e esmurrou-o com toda a sua força, sentido o seu nariz traidor quebrar-se-lhe entre as raízes dos dedos. Sem as mãos prontas para agir, o instinto levou Ricardo Brás a tentar chamar ajuda. Pouco depois não tinha língua, e o punhal de Eduardo banhava-se em tons rubi. Levando-lhe as mãos à garganta, Eduardo Fanecas fê-lo ouvir cada história sobre a prisão do pai, e sobre a sua própria solidão. Esganou-o, vez após vez, deixando-o respirar muito de lés-a-lés, para que o sofrimento se prolongasse um pouco mais. Dominante, forte e bêbado da sua loucura, Fanecas desfrutou do momento. Sentiu a sangue a fervilhar-lhe no corpo, e cada um dos seus genes Fanecas a acordar, extasiado. Pela primeira vez, sentiu-se digno do seu pai.
Brevemente, Capítulo 10
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