? (Geração ?)
Abriu os olhos devagar, receando a luz cortante que entrava pela janela aberta. Onde é que estou?, pensou, ainda atordoado pela preguiça do recém-acordado. Para averiguar, tentou erguer a cabeça, mas uma dor perfurou-lhe o ombro esquerdo e travou-lhe o movimento com estrondo. Que raio se passa!?, pensou, assustado. Não percebia a dor. Que é que me aconteceu?…
Dentre o susto e a dúvida, tentou fazer sobressair a sua faceta racional. Concentrou-se e acalmou-se. Tentou pensar no que seria aquela dor, mas nada lhe veio à memória. Esperou então que os seus olhos se adaptassem à luz e tentou novamente, sem movimentos bruscos, reconhecer o sítio onde se encontrava. Via camas. Camas e paredes de lona branca, e carrinhos com utensílios médicos… Estarei num hospital? Um esgar de dor deu-lhe uma pista sobre a razão para estar num hospital. Os movimentos que fazia, mesmo sendo leves, enjoavam-no. Via pouco nitidamente, como se o hospital estivesse ensombrando em nevoeiro. Quando elevou olhar para uma das janelas, não aguentou a náusea. Ainda tentou travar o que vinha a subir, mas quando sentiu a acidez na boca, vomitou sem cerimónias. Tentou vomitar para o chão, mas os movimentos presos pela dor não o permitiram. Cuspiu o que lhe restou na boca, enojado pelo sabor intenso. Só me faltava mais isto… Baixou os olhos, e viu como se tinha sujado. Estava sujo e atordoado. E magoado e sozinho… E perdido.
Decidiu gritar, esperando que alguém o ouvisse. Esperou. Pouco depois, uma mulher veio em passo acelerado. «Ele acordou! Doutor Herrera! Está de olhos abertos!». Finalmente, alguém… A mulher aproximou-se da sua cama, enquanto um homem de bata branca chegava também ao hospital de paredes de lona. «Até que enfim… Boas novas, finalmente! Já falaste com ele?», perguntou o Doutor Herrera. «Não, ainda… ainda não». Médico e enfermeira olharam-no então, simultaneamente. Olhavam-no como quem olha para um tesouro recém-descoberto. Cada vez menos percebo o que aqui se passa… Decidiu perguntar: «Desculpem, mas… que é que se passou? Onde estou eu?». O médico respondeu: «Não se lembra do que se passou?». «Se soubesse não perguntava, não acha!?» respondeu, visivelmente irritado; «Que sítio é este?», insistiu. A enfermeira respondeu, desta vez: «Não se lembra de ter mandado instalar este hospital de campanha? Foi…» Interrompeu-se. O médico mandara-a calar-se. Que raio tem este médico contra mim? Porque não me quer dizer onde estou e o que se passou? «Qual é o seu problema, afinal? Porque não posso saber de nada?», perguntou. O médico não respondeu. Sentou-se na borda da sua cama, e começou por palpá-lo e por auscultá-lo e por fazer outras coisas que iam para lá da compreensão do paciente. Foi então que o médico lhe voltou a falar: «Em que ano estamos?». Que pergunta é esta?… Não percebo que raio quer este homem… «Estamos em…» Em que ano estamos? «em…» Apercebeu-se que não fazia ideia do ano em que estava. Cada vez mais assustado, apercebeu-se que a sua expressão já não escondia o terror em que se encontrava. O médico voltou a intervir: «Não há problema se não souber, acalme-se. Nós estamos aqui para ajudar.» Afagou-lhe o ombro são e lançou mais uma pergunta: «Como é que se chama?». A pergunta ecoou-lhe na cabeça mil e uma vezes. Como é que me chamo? Como é que me chamo? Como é que me chamo??? Quem sou eu? Onde estou? Que se passa!?!?!?
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